terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Para além do mundo dos sonhos II

"Se a realidade, a vida que você leva, os seus projetos, as coisas que você tem, as pessoas que você conhece, enfim, se tudo isso fosse um sonho, como você o interpretaria?"(Bennett)
- ...Pois é, cara, como eu estava te contando, a minha mãe vivia dizendo que eu era um eleito...não sei de onde ela tirou isso. Maluquice de crente.
- E, naturalmente, nessa tal eleição ela foi presidente da mesa...e como presidente, o voto dela tinha peso dois, não é isso?
- (risos)Acho que é mais ou menos por aí...
- E como o voto é secreto, todos os outros eleitores estavam invisíveis...
- (mais risos) Eu nunca acreditei nessa conversa pra boi dormir. Sempre fiz tudo para provar exatamente o contrário. Não quero ser escolhido de porra nenhuma. Um dos caras que eu mais admiro é Casanova, e eu Comecei a admirá-lo quando ele disse: "Eu não troco um minuto sequer da minha vida pela eternidade no paraíso". Achei fantástico. Você já leu a biografia de Casanova?
- Não.
- Mas deixa eu te contar. Um dia desses eu acordei pensando muito nisso. Muito mesmo. Acho que tive um sonho, não me lembro, mas isso não me saiu da cabeça o dia inteiro...
- Isso o quê?
- Porra, essa coisa de ser um escolhido de Deus. Então, pensei cá comigo: "Porra, se eu sou um escolhido de Deus, por quê ele não me escolhe pra ganhar na loteria e sair dessa penúria crônica que me assola a vida toda?
- Boa pergunta...Pelo jeito, Deus tem um modo meio bizarro de tratar os seus escolhidos, ou então é um sacana de carteirinha.
- Porra, esse paraíba foi fabricar a nossa cerveja, cara?
- Tem razão - Ô paraíba!...Ô paraíba! Cadê a porra da nossa cerveja?
- Então, cara, era um sábado de manhã, nada pra fazer, e eu resolvi perambular por Copacabana. Cheguei a passar em frente a uma lotérica e tinha algo me dizendo pra jogar, mas eu não quis. Tem que ser muito cagão pra acertar num jogo em que as suas chances são de uma para nem sei quantos milhões. A praia estava lotada, Um verdadeiro formigueiro humano. A areia, o calçadão, tudo cheio de gente. Então, procurei um banquinho do lado de cá da Atlântica, embaixo de uma árvore, e fiquei ali olhando as bundas que passavam. Acendi um cigarro e fui fumando e pensando nessa porra toda. No final, joguei a ponta do cigarro no chão e imediatamente, não sei de onde, apareceu um fiscal da prefeitura.
- E aí?
- Ele veio, pegou a ponta do chão, colocou num saquinho plástico e me tascou uma multa de cento e cinquenta e sete pratas. Porra, no meio de um milhão de pessoas, aquele filho da puta me escolheu pra multar...e por causa de uma ponta de cigarro.
- Acho que você devia ter jogado na loteria...ou então Deus não gosta que os escolhidos dele fumem...


(Jan Robba em: "O livro das esquisitices")

2 comentários:

  1. Nunca esqueça, você é um escolhido, inclusive pelos fiscais.

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  2. Muitos os chamados e poucos os escolhidos...estou começando a entender esta parábola ;)

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