sexta-feira, 28 de junho de 2013

quinta-feira, 27 de junho de 2013

Muito mais do mesmo

Eram sete da noite e a campainha tocou.
- Mas que cara chato, porra!
Ela então levantou do sofá e foi pegar a toalha para entrar no banheiro. Antes, porém, disse à irmã:
- Vai lá e atende, Isabel. Se for aquele babaca de novo, você diz que eu não estou, recebe as flores e coloca em qualquer lugar aí.
E era ele mesmo. A irmã o atendeu, desconversou e, enquanto o observava ir-se embora no seu carrão, pensava em como seria divertido ter um otário daqueles apaixonado por ela...
Tudo começara umas semanas antes. Ele estacionara o carro e vinha pela calçada distraído, pensando num jeito de conquistar a mulher dos seus sonhos, aquela por quem estava encantado já havia algum tempo. A sorte parecia estar lhe sorrindo pois, ali mesmo, naquele boteco perto da esquina, estava justamente o especialista em corações femininos. Era tudo de que precisava. Entrou, pediu uma cerveja e foi puxando conversa, enquanto enchia os dois copos:
- Porra, França, muito bom encontrar você por aqui. Eu precisava muito falar com você.
- Pode falar...fora o resto do corpo, eu sou todo ouvidos...
- Cara, eu estou apaixonado por uma mulher. É a Soninha Boaventura, aquela loirinha que mora lá perto da praça.
- Conheço a Soninha...- e tomou um gole generoso do traçado que estava à sua frente, junto à cerveja.
- Não consigo tirá-la do pensamento. Estou de quatro por ela, mas o problema é que não consigo achar um jeito de conquistá-la.
- E onde é que eu entro nessa história?
- É que eu sei que você é o maior conquistador que tem por aqui. Mulher nenhuma resiste à sua conversa, e eu acho que você podia me dar umas dicas, se não se importar...
- Sei lá, acho que posso sim - e fez um longo silêncio pois, no fundo, sabia que "qualquer ajuda é inútil quando o sujeito é um banana" - mas você vai ter que fazer exatamente o que eu vou lhe dizer.
- Eu faço qualquer coisa para ter aquela mulher. Pode falar...
- Presta atenção: você vai passar numa floricultura e vai comprar um buquê de flores bonito, mas discreto. Tem que ser discreto, e não um daqueles enormes, que parecem uma privada psicodélica, entendeu?.
- Ok
- Vai na casa dela e, quando ela atender, você entrega o buquê a ela, de preferência na frente dos familiares, e apenas diz: "Isto é pra você" e então dá as costas e vai embora sem esperar nem o agradecimento. Isto funciona como uma bomba. É uma arma poderosíssima. Ela nem vai dormir pensando em você, e é justamente porque você não disse o motivo daquele buquê. Então, é a própria cabeça dela que vai dizer. E a resposta inevitavelmente vai ser a seu favor, porque os familiares também vão buzinar no ouvido dela, entendeu?
- Entendi tudo. Vou fazer isso amanhã mesmo.
- Mais uma coisa: essa é uma arma infalível, mas é uma arma pra um tiro só. Faça apenas uma vez. Espere uns dois ou tres dias e dê o bote.
Ele seguiu todas as instruções e o resultado não poderia ser outro: não só a moça ficou encantada, como também a mãe e a irmã, que presenciaram a cena toda. Ele foi para casa feliz, sentindo-se poderoso, quase um deus, e orgulhoso pela conquista já praticamente certa. Mas no dia seguinte, no trabalho, começou a matutar consigo mesmo: "Ora, ela já está no papo. Mas se só um buquê deu esse resultado...posso ter um resultado mais arrasador ainda, e eu quero muito mais: quero ela aos meus pés, babando e rastejando, toda derretida por mim. Acho que algumas doses de reforço vão deixá-la de quatro por mim". Saiu mais cedo do trabalho, passou novamente na floricultura e rumou para a casa da amada. E assim foi pelas duas semanas seguintes, quase como um ritual, até que a moça já não aguentava mais de tanta flor.
Ficou realmente perplexo tentando entender a "súbita" indiferença de Soninha e a maneira como ela o estava evitando, e chegou à conclusão de que "nenhum método é infalível" e que "ela podia ser justamente a exceção". Pensou então na florista que, do nada, vinha despertando o seu interesse nos últimos dias e pensou em dar a ela umas flores, mas "o França com certeza diria que flores não são a melhor coisa para se dar a uma florista...talvez uma caixa de bombons...ou ..."
Algumas caixas de bombons depois, passando com seu carro em frente ao mesmo boteco, lhe pareceu ver Soninha tomando cerveja no balcão, sentada com um outro sujeito, que estava com a mão na coxa dela. E era "a cara" do França...

(Jan Robba em "O livro das esquisitices")

sexta-feira, 21 de junho de 2013

Sobre as manifestações nas ruas do Brasil

Há muitos anos atrás, um fenômeno chamou a atenção da mídia, dos institutos de pesquisa, dos sociólogos e da população do Rio de Janeiro em geral. Refiro-me à votação massiva no "Macaco Tião". Isto se deu, como muitos devem lembrar, numa época em que o voto era efetuado através da cédula eleitoral e, só por ser deste modo é que foi possível aquela manifestação do descontentamento popular para com os políticos medíocres que estavam se candidatando(o que aliás nunca foi, de modo algum, uma novidade neste país). Tal fenômeno adquire um interesse muito especial, quando olhado sob a ótica comunicacional. Em primeiro lugar, tratava-se de uma mensagem nem tão explícita assim, que aparentemente queria dizer que, mesmo com um macaco no poder, estaríamos em muito melhor situação do que com os políticos que já estavam ali ou com aqueles que estavam se candidatando às eleições. Por outro lado, e tecnicamente falando, a cédula eleitoral permitia um feedback do povo para o governo, em quaisquer níveis e, se tivéssemos pessoas realmente inteligentes no poder, teriam dado ouvidos não somente àquela, mas a todas as manifestações populares. Temos sim as pesquisas de opinião, que poderiam cumprir muito bem esta função, mas sabe-se que os institutos de pesquisa estão a seviço de outros interesses que não incluem o auxílio ao governo num bom governar. Ora, se os altos escalões do Governo já erraram nisto, erraram ainda mais, por conta de uma ignorância e despreparo crônicos de seus técnicos, ao extinguirem a cédula, substituindo-a pela urna eletrônica. Em outras palavras, extinguiu-se um canal de comunicação com o povo, tornando esta(a comunicação com a população) uma via de mão única. Os Psicólogos Comunicacionais, sabem do perigo que isto representa e das consequências via de regra desastrosas disto, e este perigo veio a materializar-se agora, neste mesmo instante em que manifestações populares acompanhadas de alguns episódios de destruição do patrimônio público ou privado grassam pelas ruas de todo o país, repercutindo inclusive no exterior. Tenho visto Sociólogos, políticos, intelectuais de todo tipo tentando entender o que está acontecendo e vejo também a perplexidade (nem tão justificável assim) destes e do Governo. Quando se afirma que "o aumento das passagens foi só o estopim" eu tenderia a concordar, mas num sentido muito além do que mídia, estudiosos e governo desejam que seja. O aumento das passagens não é a mensagem, como muitos(especialmente no governo) desejariam ou esperariam. Se assim fosse, a questão estaria resolvida com uma simples redução no preço das passagens. A verdade é que, do ponto de vista comunicacional, A REBELIÃO É A PRÓPRIA MENSAGEM. Quando muitos agora afirmam que estas manifestações são o maior e mais importante acontecimento deste e do século passado no Brasil, eu concordo inteiramente, e acrescento ainda que é um dos mais interessantes fenômenos de comunicação que já presenciei, juntamente com a (há muito sabida de todos) farsa do "atentado" às torres gêmeas. Em nome de um melhor entendimento, eu daria um exemplo, a nível micro: qualquer um que tenha um cônjuge ou coisa parecida experimente impor a sua vontade, suas opiniões e seus caprichos, sem dar a menor oportunidade ao outro de se manifestar a respeito(de preferência proibindo isto). O resultado é a redundância na mensagem em escala crescente(de uma vez que outras opções, como abandonar o "campo", por exemplo, estão interditadas)de forma que o comportamento redundante(gritar, espernear, quebrar tudo) se torne a própria mensagem, o que vem diretamente ao encontro das palavras de Marshall Mc'Luhan, o "Papa" da Comunicação: "O meio é a mensagem".
Não creio que algum membro do governo venha a ler estas linhas, ou que algum político, sociólogo ou midiocrata venha visitar este blog, mas fica registrada aqui a advertência de que a violência pode chegar a níveis incontroláveis(trata-se de uma possibilidade concreta), se os governantes não abrirem um canal de comunicação com a população, já que o próprio povo, na falta de um, parece estar fundando o seu próprio: o protesto,com ou sem violência.