quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Esther way to heaven

Esther o abandonara. Se há uma coisa essencial em uma mulher, é o bom humor. "Sem bom humor, a mulher é só uma vagina acompanhada de um corpo". Era assim que definia uma mulher. Ele gostava de cantar para ela a música que ela odiava, e que lembrava os maconheiros com quem ele andava ainda nos tempos de namoro:

"And she's buying
Esther way to heaven"

Ela virava bicho. A comida saía salgada demais, ou cheia de gordura, ou queimada.
Esther o deixou e foi viver com um funcionário público, que talvez tivesse hemorróidas. Sua diversão então era embebedar-se e, quando a tarde caía, sacanear o vizinho do quarto andar, antes de sair para a rua e se enfiar em um boteco. Já sabia exatamente a hora em que o tal vizinho(que diziam ser um militar reformado por maluquice) se debruçava na janela, com a cabeça para fora e ficava olhando o tempo. Tempo infinito, o dos solitários... Dali, do sexto, tinha uma visão perfeita da careca dele, bem embaixo. Então, esperava o vizinho se debruçar na janela, mirava bem a careca dele e dava uma cuspida. De lá de baixo só se ouvia:
-Filho da puta! Vai cuspir na mãe!!!
Era divertido ouvir o careca xingar. Muitas vezes, o sentido da vida de um sujeito está em ver o mal estar dos outros mas, muitas outras vezes, o sentido está em termos um diabo no nosso calcanhar. Talvez fosse isso que Freud quisesse dizer com o seu famoso "O mal estar da civilização".
Já eram 5 da tarde. Hora do careca receber seu cuspe sagrado. Ele virou o restinho de Whisky com guaraná que havia no copo e foi para a janela. Dali ele vislumbrou aquela reluzente careca, esperando pelo seu cuspe, como a terra que espera pela chuva, para poder florir. Mirou com cuidado, soltou a cusparada e se escondeu.
De lá de baixo, ouviu de novo:
- Filho da puta! Vai cuspir na mãe!!!
Pegou a carteira, a jaqueta e saiu para a rua...



(Jan Robba em:"O livro das esquisitices")

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