quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

O médium é a mensagem

"Meu senhor, eu deploro ser portador de tão más notícias..." E o mensageiro sabia que estava perdido...Conta-se que na Roma antiga, um mensageiro que trouxesse ao rei uma notícia ruim era imediatamente executado, pois ele mesmo era considerado parte da desgraça que vinha anunciar. O mensageiro esperto, que dava algum valor ao próprio pescoço, fugia no caminho, ou teria que inventar uma boa mentira para contar. Ainda não haviam inventado o "politicamente correto", de forma que este pudesse dizer, por exemplo: "Meu senhor, o Rei Fulano de tal, com quem Vossa Majestade tem uma diferença de opinião, manda informar que já se encontra a caminho e manifestou o forte desejo de promover o vosso encontro com Deus na glória eterna" e talvez com isso livrar seu pescoço. McLuhan dizia com muita propriedade:"O meio é a mensagem". Ora, se para ser convincente aquele que fala tem necessariamente que usar a expressão facial e corporal condizentes, então faz sentido afirmar que aquele que dá uma notícia boa ou ruim, como no caso do desafortunado mensageiro acima, é em alguma medida parte do que ele está narrando. Sabe-se que entre as muitas funções de uma mensagem, e talvez a mais importante nos dias de hoje, está a de lisonjear o ego do seu portador, fazendo-o parecer inteligente, original, engraçado, etc. E hoje, em meio a esta verdadeira obssessão por visibilidade, evidentemente amplificada pelo uso das redes sociais, um sujeito pode, em nome dela, nem sequer dar-se o luxo de refletir por alguns instantes no que está veiculando. Apenas a título de exemplo, por estes dias encontrei a seguinte pérola em uma rede social: "A mulher não se vinga; ela apenas faz o que aprendeu com os homens". Sem dúvida, um argumento desprovido de qualquer vestígio de verdade prática e, por isto, muito facilmente refutável. Talvez(ou com certeza)a moça que publicou tal insanidade nem sequer parou para lembrar que, com exceção dos assuntos profissionais ou acadêmicos, uma mulher raramente pede conselhos a um homem. Na verdade, ela vai pedir conselhos à mãe ou às amigas. Então, como pode afirmar que aprendeu a ser idiota com os homens? Mas, quando se trata de tornar-se visível, a verdade do conteúdo ou a coerência do discurso importam muito pouco.Vamos recorrer a um conceito caro para nós, do meio comunicacional, a fim de entendermos melhor o fenômeno: o conceito de Médium. Médium é palavra latina que significa "meio", bem ao modo como McLuhan o coloca. Daí a palavra da moda nos dias de hoje, "Mídia", que é o seu plural. É bem neste sentido que cada ser humano é um médium, ou seja: um ser que está o tempo todo veiculando opiniões, saberes, valores, etc, que o atravessam continuamente, tanto vertical como horizontalmente e no fim é essa a razão de a cultura existir e se perpetuar. Por conta da sedução que exerce aquela estranha função da mensagem, a qual citei acima, é que uma pessoa entra em uma rede social para postar ou, na maioria das vezes, apenas retransmitir o que quer que seja que, com isto, o faça parecer inteligente, original, engraçado, etc aos olhos dos outros. Então vem a parte trágica da história: assim como num centro espírita a perfeição com que um médium "incorpora" um espírito está na proporção inversa da consciência que ele tem de si mesmo naquele instante, aquele que veicula mensagens em redes sociais(que é o nosso caso aqui) tem que estar também inconsciente de si próprio num grau maior ou menor. Dito de um outro modo, quanto mais inconsciente de si mesmo estiver o médium, mais perfeitamente ele incorpora os valores da sua cultura. É no rastro das novas Tecnologias da informação que o modelo emissor/receptor, assim como a linearidade em comunicação já não se mostram suficientes, tendo que forçosamente dar lugar aos conceitos de médium e expansão viral e, assim, hoje mais do que nunca, a máxima de McLuhan se mostra verdadeira: O médium é a mensagem.

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